#07 não sei quem me doutrinou a amar tanto o Brasil
Que me desculpem os vira-latas, mas o meu lugar não cabe no quintal de ninguém
A alguns dias atrás, no meio de um banho em terras parisienses, veio ao meu encontro uma frase tão doce quanto controversa: não sei quem me doutrinou a amar tanto o Brasil. Explico, fazia algum tempo que eu já nutria um certo clubismo-predileção pelo meu país, principalmente, em contraste com o que estava vivendo e absorvendo em terras estrangeiras.
Não há dúvidas de que o meu testemunho é corrompido. Sou nascida e criada na terra das palmeiras onde cantam o sabiás, mas isso não tem a ver com a experiência completa de doutrinação. As vezes, me pegava até mesmo ressabiada de falar com todas as letras sobre o meu país de maneira tão efusiva, como se eu precisasse guardar uma certa alegria a distância, em nome do solo de primeiríssimo mundo que estava pisando.
Mas fato é que eu buscaria o Brasil mesmo nos últimos mundos. E que a doutrinação brasileira definitivamente não ocorre para todos que possuem um RG e CPF. Ela vem de um outro jeito, e ao tentar começar a apalpar isso, entendi que ela começou quando eu tinha quatro anos e entrei na capoeira. Quando me viciei em açaí. Quando chorei mais do que sabia chorar com a morte de João Gilberto.
Quando habitei um outro espaço-tempo correndo pra buscar um coco em Morro de São Paulo. Quando li as cartas de Jorge Amado para José Saramago. Quando a Clarice Lispector e a Paola Carosella conseguiram a cidadania brasileira. Quando eu lembro que no meu país é instituído feriado com bandeiras pintadas na rua em dias de futebol. Quando penso que a gente solta pipa.
Nos últimos três meses, fui capaz de me permitir ser doutrinada ainda mais. — Dessa vez guiada pelos fios de Gal Costa e Adélia Prado, porque a doutrinação te pega pelos cabelos, amansando o coração — .
Tateei a cataquese brasileira no momento presente quando me vi ensinando a toda sorte de culturas de meninas que moram comigo a fazerem um refogado pro arroz ficar mais délicieux. Quando preparei um seminário sobre o funk 150bpm na minha faculdade e os ombrinhos de ninguém conseguiam ficar parados. Quando me arrepiei escutando Fruta Gogóia de noite chegando em casa. Quando assisti Central do Brasil, pelo motivo mais belo que existe.
Hoje, acordo com os bem-te-vis, pés descalços, chuva e umidade em toda minha pele. Pra completar, com dois chihuahuas na minha cama que eu tinha certeza que esmagaria durante a noite toda. Prontinha para aquecer um verdadeiro pão francês com manteiga, e a vida não podia ser mais bonita.
💚
Que lindo! Estou nesse processo de amar o Brasil pq tive lições muito vira-latas do que é o país. Mas senti todo seu amor lendo isso e sinto o mesmo pelo meu (país) Pernambuco