Hotel Guanabara. Hotel Metrópole. Hotel Negreiros. Hotel Londres. O perímetro do centro de São Lourenço é conhecido pelas minhas pupilas, desde quando meus pés não completavam a dança do andar, e usavam também das mãos. A tradição da viagem anual em família se deu por parte do pai de meu pai, vovó Abílio, que sofrendo das mazelas do estômago, vinha até a cidade mineira se curar nas águas.
Vovô se curava nas nascentes, quando eu nem pensava em existir. Muito menos minha família. Escutou um burburinho de jornal sobre um tal parque com nove fontes, que em quinze dias prometia a cura, e se instalou pelo raio mineiro. Um do século XIX que li, dizia — “As notícias sobre a magia da fonte, a pureza, o sabor de suas águas e seus benefícios para a saúde se espalharam rápido por toda a região".
Foi com ele que aprendi que até o elemento mais translúcido e democrático dos homens, podia também ser complexo, se visto pelo detalhe da coisa. Que água não era só água. Podia ser remédio, ter gosto de terra e bolinhas por dentro. Vovô foi curado nas águas até não ser mais. A cura não deu conta de tanto corpo. Mas a saudade que nos deixou continua se fazendo inteira aos pés do Rio Verde, na Serra da Mantiqueira. Onde todos os anos, nos reunimos em um café para trazê-lo ao pé da conversa, como se ele nos tivesse guiado até lá. Pelos rios, em silêncio.
Esse ano, porém, algo de inédito aconteceu. A viagem costumeira ganhou ares de feminino, e só mulheres foram convidadas a mesa. Minha tia, outra tia, mamãe, prima e eu. Todas as Velosos estiveram presentes, explorando um itinerário ainda mais atípico: as fazendas de azeite e de café, da Serra da Mantiqueira.
Me inteirei sobre a ausência das chuvas de agosto - mês certo para as oliveiras completarem seu ciclo - que comprometeu em oitenta por cento a produção do azeite em quase todo território nacional. Me atentei sobre os preços elevados do líquido dourado por conta de tal intempérie, e fiz degustações de harmonização com chocolate, pepino, pães, queijos e sorvete - De fato, Dua Lipa estava certa.
Logo eu, que me entendo só no hoje, como escritora, me vi sem nenhuma palavra para descrever aquilo que não conhecia. Como estrelas sem nome, me vendo na incumbência de descrever os sabores que se apresentavam no céu da minha boca. Foi assim que lembrei de vovó — quando a água não era só água, o azeite deixou de ser só azeite. O mesmo se seguiu com o café, cujo gosto sempre me trouxe repulsa, pela primeira vez, senti o gosto doce da cafeína com sabor chocolate.
Foi então que, avistando as profundidades das fazendas de café e o contraste com o tamanho daquele grão, fui capaz de entender uma frase que havia me passado batido pelos trabalhadores artesanais: — “A colheita só se dá uma vez por ano, às vezes, uma vez a cada dois anos" — O resto era trabalho, cuidado e espera.
Perdidos em meio ao tempo do asfalto, penso que queremos colher todos os dias. Nem que seja um botão de rosa. Um botão de metas. 1/365. Como se todos os dias árvores virtuais de vizinhos crescessem em comparação as nossas. E a rega em silêncio das palavras cuidado, trabalho e espera perdesse o valor. Assim como os olhares como flores-murchas, perdendo sua presença, e não se erguendo mais para cima.
No mais, que possamos nos lembrar que a água não é só água. Nem o azeite, azeite. Nem o café, café. Que todas as coisas envolvem processos, em um mundo desdobrável e invisível, que fluem desde o chão que uma criança pisa, ao céu do paladar que se expande, até o olhar de um outro alguém que te encontra.
No último dia, de tanta água lembrada, se fez sol e chuva, e um arco íris brotou no céu de Minas.
Feliz 2025. Plantemos.
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Texto muito agradável de ler, escrita fluida como as águas que você tanto citou
que bonito 💌