Um dia, deitados no sofá verde da sua casa, você me contou sobre um filme em que um enfermeiro se apaixonava por uma mulher em coma. Lembro de ter ficado horrorizada com tal premissa, já pensando em mil direções para apontar os dedos, até que você abaixou todos em retaguarda, e me prometeu que era bonito. Confiei.
Hable con Ella. Era o nome da película do escritor e diretor de El Deseo, Almodóvar. Nunca mais fui a mesma. Lembro de como os meus olhos choraram no escuro do sala, e de como quase perdi a respiração quando ouvi Caetano pela primeira vez, cantando Curucucu Paloma. Feito mantra, desde então, escuto essa música nas noites de marés mais agitadas, com os pés na piscina y con los pelos en punta.
Penso ter algo de mágico em poder crescer e dizer que se tem uma predileção por tal diretor/a. Sem trapaças, meios caminhos ou papéis carbonos. Vivendo. Sempre tive com bons olhos aqueles amantes de Win Wenders, Tarantino, ou Kurosawa. Mas se no papel já havia encontrado Lispector, agora em tela, pintava Almodóvar.
Como se nada antes tivesse tido tanta cor, ou falasse diretamente com o coração. Abandonei os livros, e me dediquei quase que exclusivamente a última das artes, com maratonas dedicadas ao diretor espanhol de Calzada de Calatrava. Descobri que Pedro havia nascido e crescido em um pueblito, e que com dezesseis anos saiu de casa para arriscar em uma Madrid turbulenta. Conseguiu um trabalho como assistente de telemarketing, e depois de dez anos escutando todo tipo de vozes e histórias, lembrou que era também artista. Com filmes de guerrilha, convidava amigos próximos para atuar e lançou seus primeiros filmes em bares.
Não me canso das histórias que moram embaixo das histórias, não me canso de Pedro. Sinto como se houvesse encontrado um mundo em que não existe espaço, nem fôlego para julgamentos. Como se o vermelho de Almodóvar permitisse que a humanidade fosse toda explícita em movimento, sem clichês estáticos de qualquer sorte. Movimento esse presente no corpo de mulheres que matam seus maridos na cozinha, despejam sonífero em gazpachos, tomam heroína em conventos e falam com suas mães fantasmas que já não estão mais aqui.
Não há limites para tamanho sensacionalismo da realidade — pintada com muito vermelho, castellano e mulheres belíssimas — acho que a minha esperança tem exatamente esses predicados, e por isso, agradeço.
No último feriado, viajei para as montanhas com a minha família. Éramos cinco. Alugamos dois quartos em um cassino desativado, e eu, em uma valsa onde cada um escolhe seu par, transitei pelos corredores de listras verdes e brancas, entre ambos os mundos: o quarto de minha mãe e irmão, e o quarto dos meus avós.
Marcando um xis em algumas profissões a mais no último registro, ocupei o lugar de guia turística, mediadora de conflitos, enfermeira e cuidadora. Com ênfase no último que na língua portuguesa despende de qualquer sinônimo a altura. Cuida da dor. Me dei conta de quanto cuidado e carinho meus avós precisavam. Tendo ficado muito tempo longe, só conseguia alcançar sorrisos, em “ligações por foto", mas agora podia enxergar e acolher as dores. Foi por isso que voltei.
Não pude deixar de pensar em Almodóvar enquanto empurrava a cadeira de rodas pelos elevadores verdes do cassino abandonado, de botas de salto alto. A cena já existia. Era palpável, como o cansaço do fim do dia. Também não pude deixar de pensar em Ainda Estou Aqui, de Walter Salles, e da minha promessa de fazer da memória um presente. Levei uma das câmeras herdadas de vovô, e me pus a fotografar as mãos, cabelos, rodas, remédios e sorriso. Longe das obrigações zuckerbergeanas, lembrei que foto é arte, e de que é preciso hablar con elles.
Ironicamente, ou não, o título da última indicação de filme foi exatamente o que culminou no fim. Mesmo você prometendo que era bonito. Confiei.
« El cerebro de la mujer es un misterio, y en este estado, más. A las mujeres hay que tenerlas en cuenta. Hablar con ellas, tener un detalle de vez en cuando. Acariciarlas de pronto, recordar que existen, que están vivas y que nos importan. Esa es la única terapia, se lo digo por experiencia ». Hable con Ella, Almodóvar (2002).
chamadinhos especiais
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