Hoje, completo um mês de Brasil. Ou poderia dizer, uma vida de Brasil? Tendo finalmente concluído todos os meus principais exames de raioxyzes e de sangue - Anemia, colesterol um pouco elevado e falta de Vitamina D - consigo, no agora, traçar o que seria considerado uma rotina-calmaria, que se esvaí completamente quando escuto as mesmas perguntas quase todos os dias: Fica até quando?de vez?
Recentemente, assisti a uma sequência de histórias de uma amiga muito querida que problematizava a fala de outro amigo querido. Com toda educação devida, ela se pôs a refletir sobre um trecho da conversa que os dois tiveram. Aqui, cabe um contexto antes do texto. Essa amiga há anos mora na Europa. Tornou-se mestre, e agora estava em uma vaga de trainee temporária no velho mundo. A conversa era:
"Cê vem pra ficar então né? Não funcionou por aí?". Caca, minha amiga, então, decidiu dividir o absurdo em dois. Com atenção a primeira pergunta - sobre vir para ficar ou ficar de vez - ela rebateu a ideia de uma falsa permanência que ela mesma já não compactuava. Como se voltar para o seu país de origem pudesse ser voltar para ficar. Como um rio que encontrando novos afluentes, pudesse perder sua foz.
Uma das dezenas tentativas de permanência no meu antigo espelho em Paris.
Depois, resolveu se estender para a segunda pergunta - Não funcionou por aí? Essa, pelo tom de voz, pude perceber que dentre os absurdos, pudesse ser o mais descabido. Minha amiga, dessa forma, rebateu a pergunta com outra : O que é funcionar, gente? Seguindo com uma tentativa de refletir sobre a formação cultural brasileira e suas especificidades:
“Isso aí vem de um background muito cultural (…) de um lugar bem chatinho do brasileiro de sempre achar que você ir para o exterior, e você ficar de vez, nunca mais voltar e de ninguém saber de nenhum rastro da sua vida é o funcionar. Sendo que muita gente faz isso, e sei lá fica presa em um outro país, não consegue renovar visto, não consegue documento, e nunca mais consegue voltar. Passa uma barra do cacete, ou a pessoa não consegue prosseguir na própria carreira e tem que sei lá virar qualquer outra coisa para conseguir comer. E aí, isso é funcionar, só porque conseguiu ficar definitivamente na Europa”.
Tentativas de permanência. Sujeito/Objeto. Paris, 2024.
Todas as frases de Caca me tocaram profundamente, como se elas já existissem no fundo da minha cabeça, e só agora teriam tomado a solidez necessária. E, aqui, acrescento um outro ponto que me indigna profundamente. Para além das falsas permanências, reivindicações pelo seu lugar de origem, e vira-latismos de todos os tipos, nós mulheres passaríamos por um outro tipo de crivo: Não conseguiu arranjar nenhum europeuzinho, não? Suspiros para retomar o folêgo e o parágrafo.
Depois de algumas experiências com o outro que habitava um Atlântico para além de mim, percebi que a tradução me era muito custosa. A tradução de tudo. Da minha língua, do meu gosto, do meu corpo e até da minha alma. Percebi que não fazia sentido (para mim) perder piadas no silêncio quando não tinham tradução, colocar farofa na boca de alguém, ou ter que explicar quem era o Faustão. Isso era condição sine qua non. E um exemplo perfeito disso é o terceiro filme da trilogia Before the Midnight, depois me conta o que achou?
No mais, volto de vez, porque toda volta é completa no que se é. Fico de vez, porque estou inteira mesmo sabendo que vai passar. Retorno porque deu errado justamente porque deu certo, e certo no que deu errado. E não arranjei nenhum europeu, porque nenhuma nação jamais chegou aos pés de um samba brasileiro.
Se cuidem,
B.
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Clube do Livro!
Depois de muito desejo e saudade, anuncio finalmente o meu próximo Clube do Livro!Nápoles em quatro atos ✨ O clube-espaço de leitura dedicado à tetralogia napolitana de Elena Ferrante.
Mês a mês, exploraremos e discutiremos cada livro, a amizade entre as personagens Lila e Lenu, e claro, a relação de ambas com Nápoles. O livro que daremos início em outubro será "A Amiga Genial" (2011), o primeiro da tetralogia e recentemente eleito pelo New York Times como a melhor obra do século XXI. Neste romance inicial, acompanharemos a infância e adolescência das personagens Lila e Lenu, com todas as complexidades e contrastes que marcam suas vidas.
Insuportavelmente chique, eu tenho a honra de anunciar a vocês que agora eu sou uma parceira Escrevedeira. Sim, o espaço cultural criativo dedicado a escrita e ao desenvolvimento literário - fundado por ninguém mais, ninguém menos que Noemi Jaffe 🥲. Juro que tremo enquanto escrevo essas palavras, muita mais muita emoção de estar ao lado daqueles que tanto admiro.
E nesse mês já tenho meu lugar garantido no curso presencial (me respeita que eu preciso conhecer essa casinha pessoalmente) Caminhar pela cidade, caminhar pela literatura, com o professor Mauro Callieri. Não é de hoje que o assunto do caminhar, e da flâneuse me abastecem o peito e me inspira o andar, então quando me deparei com esse, não tive dúvidas.
A partir de Walter Benjamin, Michel de Certeau, Thoreau e outros, vamos flanar, fazer arte, nos perder e, quem sabe, nos achar. Seguiremos prosadores e poetas que traduziram suas experiências em metrópoles como Londres, Paris, Nova York, Tóquio e Lisboa. No Rio, exploraremos as transformações da cidade através de Machado de Assis, João do Rio e Nelson Rodrigues, e em São Paulo, passaremos por várias épocas com Oswald de Andrade, Carolina de Jesus e Emicida. Estou ansiosa para aprender mais sobre escuta, diálogo, curadoria, mediação e o prazer de compartilhar a literatura.
ouvi as mesmas perguntas 🙃
...é isso...