#45 a uma boa notícia de ser a pessoa mais feliz do mundo
Siddharta, ser a pessoa que fica e encontrar o centro em meio à cidade
Em um primeiro relance, pensava que todas as ruas de Lisboa caminhavam para um sim à vida. Depois, um olhar para si mesmo. Em cada esquina, uma afirmação. Era esse o convite escrito em todas as ruas e portas da cidade. Até que finalmente sanei a minha própria dúvida, e fui informada de que a sigla S.I. correspondia ao Sistema de Incêndio lusitano. Onde crepita o fogo, arde-se sempre o desejo de si.
Recentemente, venho tendo poucas certezas. Sobre o sim, ou sobre o si mesmo. Passados dois meses no meu refúgio em Lisboa, me encontro assim como a cidade, sem um centro. Frouxa em pensamentos. Explico. Tendo recém completado um mestrado que traduziu minha língua e meu corpo a uma estrutura francesa por dois anos, pensei que precisava me encontrar de novo na palavra. Logo, férias em Portugal.
A idéia era me candidatar para o máximo de vagas de emprego que eu podia, ler Saramago, Campilho e Mãe e desenhar cinco tonalidades diferentes do mar que encontrava a vila de Cascais. Não sabia o que vinha pela frente. Para todos os amigos que me perguntavam sobre futuro, eu respondia que as melhores decisões seriam tomadas quando eu me encontrasse melhor. Cenas dos próximos capítulos, e etc. Subterfúgios mil para acalentar uma fé que no fundo sabia que tudo que eu precisava me encontraria, do jeito que sempre me encontrou.
Mas no meio da esperança, no meio da dança, também existia o medo. O medo de ter que voltar ao Brasil por definitivo e não me reconhecer mais. Pensava que ao pousar no Galeão, todos os portões estrangeiros se fechariam para mim automaticamente. Em um exílio verde e amarelo que eu mesma havia pintado em irracionalidade. A minha única esperança, portanto, era achar um emprego no outro lado do Atlântico. Prolongar minha estadia. Estava sempre a uma boa notícia de ser a pessoa mais feliz do mundo.
Até que, após uma planilha de tentativas frustadas no Excel pintada de amarelo, lilás e muito salmão, representando o vermelho em uma tonalidade menos ácida aos meus olhos, entendi que precisaria esperar mais. Recuperar o fôlego. Tomar distância. Do não momentâneo. Até encontrar o sim, que juntaria todas as partes do si mesmo. Que ligaria todos os meus pedaços espalhados em Lisboa, Paris, São Paulo e Rio de Janeiro. Era preciso voltar. Agrupar. Organizar. Limpar.
Tudo que tenho, até invariavelmente, eu mesma.
A boa notícia era que, pela primeira vez, ao invés de ser a pessoa que vai, queria ser a pessoa que fica. Justamente porque fui - e a vida fez questão de me ensinar muito entre todos os compassos e pêndulos. Não sei até quando se estabelecerá o meu ficar. Como nos relacionamentos amorosos tão brasileiros que antes de serem uma relação, experimentam o alojar-se na relação. Somos ficantes, longe de ser categoria exclusiva adolescente penso que tal status é de uma beleza eterna da nossa língua. Escolhemos ficar, por enquanto.
Sei que, no hoje, escolho ficar para celebrar casamento de amigos. Para ouvir a voz dos meus avós no sábado de manhã antes da feira, ver as minhas amigas se bronzeando na praia, e para passear com os meus cachorros. Escolho ficar para não ter medo. Para aprender a não fugir.
Depois de comprar a derradeira passagem de retorno, me lembrei das palavras de Siddharta, o livro que mais me comoveu nos últimos tempos:
"Siddharta abriu os olhos e olhou em redor, um sorriso iluminou o seu rosto e um profundo sentimento de despertar de um longo sonho percorreu todo o seu corpo. E recomeçou imediatamente a andar, e andar com ligeireza, como um homem que sabe o que tem que fazer.
Ah - pensou ele, respirando fundo -, não quero que Siddharta me volte a escapar! (…) Não quero voltar a matar-me e fragmentar-me, para encontrar um segredo escondido por entre os destroços. Não quero aprender mais Yoga-Veda, ou Atharva-Veda, ou os ascetas, ou qualquer outra doutrina. Quero aprender comigo mesmo, quero ser o meu aluno, quero conhecer-me, conhecer esse segredo chamado Siddharta"
(2023, p. 47)
No mais, que encontremos nosso centro no aprender a ser alunos de nós mesmos, com cuidado com as sabedorias ainda não conquistadas.
Tudo no seu tempo.
Até breve,
B.
Indicações da Semana #15
▶️ Indicação de vídeo e livros: Vídeo sobre as minhas leituras de julho! Como já diria Chico Bosco, “uma pessoa com pensamento crítico não teme livro algum”. KKKKKK. Brincadeiras à parte, julho foi o meu mês de férias, e assim, aproveitei para me aprofundar em leituras digamos que não corresponde com a minha persona literária basal, como o clássico Como Ganhar Amigos e Influenciar Pessoas, de Dale Carnegie, com mais de 16 milhões de cópias vendidas.
No final do mês, tive a mais bela das surpresas lendo Siddharta, de Herman Hesse, que me tirou o fôlego do início ao fim, e entrou como o melhor livro do meu 2024. Se quiser saber mais, te convido a assistir ao vídeo completo. No YTB, assim como por aqui, eu encontro os melhores comentários e as trocas mais gostosas <3
chamadinhos especiais
Insuportavelmente chique, eu tenho a honra de anunciar a vocês que agora eu sou uma parceira Escrevedeira. Sim, o espaço cultural criativo dedicado a escrita e ao desenvolvimento literário - fundado por ninguém mais, ninguém menos que Noemi Jaffe 🥲. Juro que tremo enquanto escrevo essas palavras, muita mais muita emoção de estar ao lado daqueles que tanto admiro.
E nesse mês já tenho meu lugar garantido no curso Escrever, Escrevendo-se, que será ministrado na sexta-feira que vem, pela Tatiana Salem Levy. Em uma carta com um dos meus ex-amores no mês passado, acabei recebendo a indicação do mais recente livro de Salem Levy, Melhor Não Contar, e qual foi a minha surpresa ao começar a ler na noite de ontem e já estar na página cem.
Muito ansiosa para o encontro e para entender um pouco mais do percurso de escrita de Tatiana e de demais escritores que irão compor o desenho da aula, como Marcel Proust, Virginia Woolf, Marguerite Duras, Tamara Kamenszain e Annie Ernaux. Além dos exercícios práticos ao final da aula, <3.
Se eu fosse você, conheceria a casa Escrevedeira caso resida em SanPabla, e daria um olhar cuidadoso na plataforma com todos os cursos gravados, on-line's e clubes do livro. Ah, e não se esqueça de usar o meu código para 10% de desconto em todos os cursos do site: BGVLS10
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Escrevedeira: BGVLS10 (tá, mas vocês entenderam que a Noemi Jaffe sabe quem eu sou?)
leia as news anteriores
uau, muito obrigada pelas repercussões da ultima news! a mais lida por aqui de todos os tempos, fiquei até tímida ao começar a #45, mas ainda bem que o meu processo de entendimento de mundo passa pela escrita, e não, pelas métricas.
bonito ver que todas as últimas quatro news foram escritas em Lisboa. dois meses, quatro news, o paraíso das metódicas sem fim. maratonar é de graça, <3.
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pqp que texto lindo! beijinhos de Lisboa.
o tipo de texto que dá vontade de viver